Criado em 1971, o Programa de Pós-Graduação em História Econômica da Universidade de São Paulo (USP) tem se destacado pelo seu pioneirismo no Brasil como programa de pós-graduação específico de História Econômica, constituindo-se como um marco de referência nacional na formação de profissionais com destacada atuação na docência e na pesquisa na área. Ao longo desse período foram formados quadros hoje atuantes nas mais diversas universidades do país. Os pesquisadores formados pelo Programa também atuam na área de educação básica, de patrimônio, de políticas públicas, ciência e tecnologia, economia e administração. Essa diversificação, que reflete as mudanças intensas no perfil de atuação profissional dos historiadores, foi levada em conta pelo Programa na atualização, em anos recentes, de suas linhas de pesquisa.
Do ponto de vista teórico-metodológico o programa tem-se dedicado ao estudo e à pesquisa da História Econômica na perspectiva dos historiadores, buscando ir sempre além do arrolamento cronológico e/ou quantitativo das ocorrências econômicas, mas compreendê-las dentro de contexto social mais diverso, em que o econômico só pode ser entendido quando relacionado à política e à cultura. Parte, portanto, de visão mais ampla da economia, como instância do histórico, em movimento dialético e não em perspectiva economicista. Tal posicionamento teórico implica na possibilidade de uma gama variada de análises, desde as conceituais, até as econométricas, fixando-se principalmente na produção social dos eventos econômicos. Essa perspectiva tem permitido que diferentes pesquisadores possam trabalhar uma gama diversa de temas de pesquisas, preservando a heterogeneidade desde fundamentos comuns que integram a essência do programa desde sua fundação.
Desde sua criação em 1971, o Programa de Pós-Graduação em História Econômica tem apresentado diferentes tendências, expressas em suas linhas de pesquisa e de orientação, que seguem de perto o movimento da historiografia nacional e internacional e que se alinham ao perfil do seu corpo docente e discente.
É importante ressaltar que estudos de História Econômica que se tornaram referências clássicas foram desenvolvidos antes mesmo do nascimento do Programa nos anos 1970. Nos anos 1950 e 1960, inúmeras teses viriam enriquecer as análises sobre o Brasil e a América Latina em geral, enfatizando, especialmente, a questão do comércio e da agricultura.
Nos anos 1970, o perfil do primeiro corpo docente que formou os quadros do Programa representava a síntese das preocupações de pesquisa na área, abrindo um leque de opções aos alunos ingressantes e assegurando um trabalho fecundo de orientação acerca dos seguintes temas: Sistemas Econômicos, Comércio Colonial, Estrutura Agrária, Escravismo, Modernização e Industrialização, Relações de trabalho e Sindicalismo. Do ponto de vista temático e teórico, a década de 1970 refletiu modificações importantes no corpo da produção intelectual com a abertura de novas perspectivas de análise, enfocando os grupos minoritários, os estudos regionais, os mercados internos, dando-se relevo às abordagens quantitativas.
As pesquisas concluídas na década de 1980, tanto por parte do corpo docente quanto discente, seguiram a trilha fecunda do momento anterior, pautando-se por análises regionais, com cortes no tempo e, principalmente, pela revisão de temas antes consagrados, abrindo, assim, possibilidades novas de pesquisa.
No decorrer da década de 1990, o Programa, face à ampliação do número de orientadores credenciados e ao aumento da demanda dos alunos, atualizou e adequou o seu perfil. Preocupações teórico-metodológicas, advindas dos momentos anteriores, levaram à redefinição das linhas de pesquisa do Programa, de modo a preservar o caráter aberto e plural da USP, de modo geral, e do Programa de História Econômica, em particular.
Essa primeira tentativa de rearticulação das linhas de pesquisa mostrou, no entanto, que ainda havia muito a ser feito no sentido de identificar potencialidades e especialidades do corpo docente, de modo a que se traduzissem em projetos de pesquisa individuais e coletivos, cursos e atividades de orientação. Essa composição, que se revelou insuficiente para contemplar a diversidade de enfoques desenvolvidos pelos docentes nos cursos lecionados e nos trabalhos de orientação, evoluiu, em 2001, para as discussões do Colegiado sobre questões teóricas e tendências do Programa, resultando em novo perfil com a criação de cinco linhas de pesquisa.
O programa de História Econômica da USP oferece uma ampla e diversificada gama de ofertas disciplinares que cobrem todas as linhas de pesquisa e áreas historiográficas do Programa e que são ministradas pelos docentes permanentes, colaboradores e visitantes. Muitos dos professores visitantes são convidados, notadamente estrangeiros, que cobrem áreas de ponta do conhecimento histórico. Além disso, as disciplinas do Programa recebem muitos alunos externos, oriundos de outros programas do Estado de São Paulo e de outros estados do Brasil, assim como tem sido comum a presença de alunos estrangeiros.
Com a renovação e ampliação do corpo docente ocorrida nos últimos anos e, consequentemente, com a incorporação de novas especialidades e temas de pesquisa, tornou-se patente a necessidade de reestruturação do programa, tarefa para a qual foi designado um grupo de trabalho composto por seus docentes. Em 2015 o programa realizou seminário para reorganizar suas Linhas de Pesquisas. Esse processo com as novas Linhas começou a ser implementado no início de 2016.
O Programa de Pós-Graduação em História Econômica, dado o caráter híbrido da área, como indica o próprio nome, e sendo fundamentalmente interdisciplinar, serve-se de métodos, teorias e técnicas da História e da Economia que, por sua vez, dialogam com diversos outros campos do conhecimento. Trata-se de analisar o fato histórico como fato econômico e vice-versa, devendo-se destacar diversas temáticas privilegiadas pela área.
O programa busca especificamente:
- Contribuir para a consolidação e difusão dos estudos de História Econômica;
- Formar mestres e doutores especialistas na área;
- Oferecer disciplinas, seminários e oportunidades de pesquisas na área a partir da experiência e da produção de seus docentes;
- Incentivar pesquisas de iniciação científica em História Econômica em articulação com os cursos de graduação da universidade;
- Capacitar o pós-graduando a analisar a conjuntura econômica e social da atualidade, no sentido de fomentar a formação de um quadro técnico habilitado a contribuir para a formulação de políticas e ações sociais adequadas ao contexto histórico nacional e internacional.
- A prospecção de novos temas e domínios de pesquisa histórica, sem perder os fundamentos de qualidade que marcam o Programa desde sua fundação.
- A intervenção no debate historiográfico brasileiro e internacional, através da atuação e produção intelectual dos seus quadros docentes e discentes.
Atualmente existem sete Linhas de Pesquisa ativas no Programa, que envolvem projetos com docentes e discentes e têm produção constante registrada em seus relatórios, quais sejam:
- Teoria, Historiografia e Pensamento Econômico
- Demografia, Escravidão e Trabalho
- Agricultura, Estrutura Fundiária e Mercados
- Indústria, Tecnologia e Urbanização
- Patrimônio e História de Empresas
- Economia da Cultura
- Instituições e Políticas Públicas
As atuais Linhas de Pesquisas buscam temas, questões e fontes cuja investigação pressupõe uma maior abertura teórica, de campos de estudo e de atuação das pesquisas em História Econômica.
O temas e perspectivas relacionados à Teoria, Historiografia e Pensamento Econômico foram relacionados como linha específica e que se destina à reflexão histórica acerca da produção intelectual relacionada ao campo da história econômica. A linha inclui estudos sobre a construção do conhecimento histórico no tempo, atentando para o lugar da história econômica e para suas relações com outras linhagens historiográficas. Nesse sentido, a linha abre espaço para a discussão acerca dos métodos e inclinações teóricas envolvidos na produção historiográfica. Também fazem parte desta linha pesquisas que versam sobre as trajetórias das ideias econômicas no tempo e no espaço, mediante o uso de fontes relativas à produção intelectual sobre questões econômicas, teóricas e práticas, em diversos contextos históricos.
A linha de pesquisa Demografia, Escravidão e Trabalho busca abordar estudos sobre demografia histórica, da escravidão e dos diversos aspectos relacionados ao mundo do trabalho. A linha incorpora também estudos sobre gênero, família, fluxos migratórios, dentre outras temáticas relacionadas à inserção no mercado de trabalho de diferentes contingentes populacionais.
Outra linha de pesquisas que reagrupa estudos tradicionais do programa está associada sob a denominação Agricultura, Estrutura Fundiária e Mercados e está contemplando pesquisas que tratam dos diversos tipos de atividade comercial – comércio atlântico, comércio interno, externo, de abastecimento, de bens e serviços, interprovincial, etc – desenvolvidos no Brasil, em outros países e entre o Brasil e o resto do mundo. Estudos sobre as transformações históricas experimentadas pela agricultura, bem como sobre as mudanças que se processaram na estrutura fundiária dos diversos complexos agrícolas, fazem parte do rol temático desta linha. A ele, acrescenta-se também análises voltadas para a organização dos mercados de terra e de gêneros agrícolas, para as inovações técnicas aplicadas à agricultura, para as estratégias de comercialização dos bens agrícolas e para a ascensão da agroindústria no Brasil e em outras partes do mundo.
As áreas e estudos ligados à Indústria, Tecnologia e Urbanização buscam abordar análises sobre as transformações da sociedade moderna. Tendo como objeto de estudo as cidades e as indústrias, as pesquisas devem enfatizar as novas relações de indivíduos e sociedades com o desenvolvimento da ciência e tecnologia, assim como com os novos padrões de sociabilidade constituídos a partir do processo de urbanização. Pesquisas sobre o desenvolvimento tecnológico, da formação de setores industriais, de projetos de urbanização e de intervenção no espaço urbano, além dos atores relacionados às transformações das cidades, da evolução da produção industrial e do desenvolvimento científico fazem parte desta linha.
A relação entre Patrimônio e História das Empresas está conformada como outra linha do programa e abarca estudos relacionados ao processo de acumulação de riqueza, tanto individual como empresarial. Neste sentido, fazem parte desta linha estudos sobre a evolução patrimonial das sociedades, mediante o uso de documentação, como inventários post-mortem, registros de imóveis e de hipotecas, entre outros, assim como estudos sobre a história de empresas, por meio de relatórios empresariais, balanços contábeis, etc. A linha engloba a análise da constituição ou da própria desconstrução do patrimônio de indivíduos, de famílias, de empresas e, de maneira mais ampla, de sociedades.
A linha de pesquisa Economia da Cultura busca privilegiar a análise econômica de objetos relacionados às produções simbólicas e materiais das sociedades. Tem lugar nesta linha a análise econômica do espetáculo cênico (teatro, música, dança), do mercado de arte, do patrimônio e das indústrias culturais (livro, disco, cinema, moda, propaganda). Reflete-se sobre questões relacionadas ao mercado de bens simbólicos, ao consumo de bens culturais e às políticas públicas voltadas para diversos segmentos culturais (intelectuais, religiosos e artísticos).
Outra linha agrupa estudos sobre Instituições e Políticas Públicas com a perspectiva de comportar estudos sobre as diversas instituições políticas, econômicas e sociais existentes tanto em contextos nacionais quanto internacionais. Além disso, a linha também se volta para a análise da atuação dos diversos atores – Estados, empresas, consumidores e organizações da sociedade civil – envolvidos no mundo da produção ou no processo de tomada de decisões políticas. Como uma das instituições mais frequentemente estudadas, o Estado, assim como as políticas econômicas dos governos, tem um lugar privilegiado nesta linha enquanto objeto de estudo. Assim, pesquisas sobre a origem e o desenvolvimento dos Estados nacionais, a institucionalização de regras sociais e econômicas, além dos instrumentos de políticas econômicas, são alguns dos diversos temas que encontram guarida nesta linha.
As linhas também são eixos orientadores na organização dos Seminários de Pesquisa, envolvendo os orientandos e seus respectivos orientadores. Nesses seminários os alunos apresentam os resultados parciais das pesquisas de mestrado e de doutorado, que são amplamente debatidos pelos participantes e, na maior parte das vezes, acabam sofrendo ajustes e inflexões. O momento maior dos Seminários de Pesquisa ocorrem durante o Congresso Anual do Programa de História Econômica. Durante esse evento as Linhas de Pesquisas norteiam e agrupam docentes e discentes, além de permitirem que coordenadores articulem suas atividades com os laboratórios e centros de estudos. É também a oportunidade em que professores e estudantes, tanto da pós-graduação como aqueles de graduação de diferentes unidades da USP, bem como de outras instituições do país, trocam experiências e revelam afinidades de estudos e reflexões comuns.
O programa de História Econômica da USP possui uma vasta e longa tradição na produção e publicação de obras referenciais para a historiografia brasileira. A produção de professores e alunos é ampla e diversificada, voltada para diferentes áreas abrangidas pelas linhas de pesquisas. Os docentes têm produção sistemática em editoras de prestígio, assim como em revistas científicas nacionais e internacionais. Tradicionalmente, a produção é distinguida com prêmios de destaque nacional e também com prêmios internacionais.
O programa desenvolve diversas iniciativas relacionadas à internacionalização das suas atividades. Entre estas iniciativas podemos destacar as visitas de docentes do exterior, as atividades de docentes e alunos em apresentação de trabalhos em universidades, a presença marcante de estrangeiros como alunos do programa, os diferentes projetos de pesquisas de docentes envolvendo contatos e redes de colaboração externas, os intercâmbios do programa através dos seus vários Laboratórios, núcleos e centros de estudos, além das atividades acadêmicas como palestras, simpósios e congressos realizados periodicamente.
A internacionalização do Programa assumiu, ao longo dos últimos anos, um caráter mais institucionalizado, com o estabelecimento de acordos de cooperação com programas de pós-graduação estrangeiros, bem como com o estabelecimento de redes de pesquisa.
A História Econômica existe como área de concentração ou especialização em algumas universidades brasileiras, porém a existência de um programa antigo, especializado e consolidado como o nosso é único e permite ensejar o avanço da pesquisa na área. Isso vem sendo possível mediante o esforço de seus docentes e discentes, seu compromisso com a formação, o bom debate público e o apoio imprescindível da USP, de outras universidades, agências de financiamento à pesquisa e à demanda de instituições acadêmicas, empresariais e de pesquisa, públicas e privadas, por uma compreensão mais profunda e consistente da conjuntura e das estruturas econômicas e sociais, visando à inserção e atuação mais qualificada no trabalho e na sociedade.